sexta-feira, outubro 15, 2010

Wagner Moura em Coragem sob fogo, na Revista Rolling Stone

Do alto de seu jeito de garoto, ele é um dos grandes atores brasileiros de todos os tempos e o mais popular de sua geração. Com a farda preta do Capitão Nascimento, deu vida ao maior anti-herói do nosso cinema. Agora, Wagner Moura se prepara para mais uma vez, ser o alvo do público e da crítica em Tropa de Elite 2

Capa Wagner MouraWagner Moura estama a capa da nossa edição de aniversário

Wagner Moura aperta o play. Na pequena tela do celular a imagem é escura. Mas dá para ver um astronauta abrindo o portão e entrando em uma casa. É noite. Ele deve estar rindo por dentro do capacete redondo que faz parte do traje prateado. Igual àqueles que a gente vê no cinema. A força gravitacional da Terra não apresenta empecilho, mas o astronauta caminha pelo jardim como se estivesse na Lua. "Bem, tem uma visita aqui para você, venha ver!", avisa a mãe. O garoto, um tanto desconfiado, aparece na cozinha, vai até a sala e dá de cara com o estranho. Não há susto nem choro, mas a reação é imediata: empunhando duas espadas de plástico, Bem, um pequeno príncipe de 4 anos, vira um gigante e vai para cima do suposto invasor. E dá-lhe espadadas. O garoto é corajoso. Provavelmente ele está somente brincando. Mas, talvez, na cabecinha em formação de Bem, ele esteja defendendo a casa, a mãe e o irmão de uma invasão extraterrestre - o pai não está, então ele é o homem da família naquele momento. Percebendo que seus golpes não têm resultado, se esquiva e recua, sendo perseguido pelo inimigo. Até que é agarrado. Com as mãos envoltas por grossas luvas, o astronauta leva o menino até o colo e levanta a viseira espelhada do capacete revelando sua identidade. O rosto de Wagner Maniçoba de Moura é mais do que familiar a Bem. Pai e filho sorriem e então se abraçam. A conversa que se segue entre os dois é difícil de ser ouvida no vídeo gravado pelo aparelho de Wagner na noite anterior, a última diária de filmagem de O Homem do Futuro "uma comédia doida, com ficção científica, do Claudio Torres". Com o N95 preto na mão, no estúdio onde em minutos aconteceria uma sessão de fotos, o ator se derrama em orgulho. "Ser pai é um barato muito grande, né, cara? Não dá nem pra explicar."

A culpa pode ser atribuída ao Capitão Roberto Nascimento, o personagem principal de Tropa de Elite, maior fenômeno pop do cinema nacional dos nossos tempos. Ou a Olavo Novaes, vilão global querido pela audiência que protagonizou, na novela Paraíso Tropical, cenas das mais tórridas com a prostituta vivida por Camila Pitanga no horário nobre. Ou simplesmente ao ator que os interpretou. Pode ser o jeito pacato e meio largado, a cara de bom moço e o sorriso agradável e sincero. Ou ainda o entusiasmo latente que parece transbordar junto com as palavras cada vez que ele fala do que fez, está fazendo ou fará - o mesmo entusiasmo que ele tanto preza e tem medo de perder: " Nunca tive medo de envelhecer, mas não quero perder um entusiasmo e uma inconsequência de garoto que são tão caros ao meu trabalho". Seja qual for a razão, não seria exagero afirmar que Wagner Moura é o mais interessante, senão o melhor ator masculino de sua geração. Ainda que sejamos bem servidos de jovens contundentes nos nossos palcos, televisores e cinemas, nenhum deles é tão popular e desperta tanta curiosidade quanto o soteropolitano de fala mansa, nascido há 34 anos, filho do sargento da aeronáutica Seu José Moura e da dona de casa Dona Alderiva, irmão da pediatra Lidiane, formado em jornalismo, perdidamente apaixonado pelo teatro e pela família, torcedor do Vitória da Bahia, simpatizante do governo Lula - pero no mucho -, eleitor de Marina Silva e que escolheu o Rio de Janeiro como morada desde 2000. Ao mesmo tempo que o ator (e não os personagens que incorpora) e o homem que ele é são "a mesma pessoa jurídica", em uma simbiose natural de quem parece ter nascido para fazer o que faz, é nítida a impressão de que Wagner é um ser desprovido da habitual máscara, do "sorriso para imprensa" que colegas da vida artística costumam apresentar aos desconhecidos interessados em seus segredos.

Ele não deve, não teme e mantém, preservadas na superfície, as respostas que se mostrariam mais reveladoras sobre sua vida pessoal. Não é raro ouvi-lo responder: "Não poderia te dar uma resposta sincera sem entrar demais na minha privacidade ou na de minha família". No caso de Wagner Moura, o que mais interessa é o que se vê e ouve. E também o que se intui. Se ele está fazendo o gente fina, o desencanado, o verdadeiro, coisa que minha intuição duvida, restaria concluir apenas que ele é muito bom nisso.

Assista abaixo ao making of das fotos com Wagner Moura:



Enquanto o carro que nos conduz até a casa do ator cruza o Rio de Janeiro em direção à Zona Sul, em uma tarde de quarta-feira de setembro, debaixo de sol, Wagner fala sobre seu projeto pessoal da vez. "É um filme de memórias, um fluxo de imagens que vão reproduzindo a memória desse cara que sou eu sobre a cidade dos meus pais, Rodelas, que foi inundada em 1988 por causa da construção de uma barragem. Eu tinha 11 pra 12 anos." Convidado pelo mais brasileiro dos estilistas, o mineiro Ronaldo Fraga, a participar de uma exposição sobre o rio São Francisco, o ator está revisitando memórias em forma de velhas imagens, fotos, documentos e qualquer material daquela época para montar o filme de cinco minutos que será exibido ininterruptamente no local do evento. "Lembro-me pouco do que fiz dias atrás, mas me lembro muito da minha infância. E me lembro bem de Rodelas, porque a gente sempre passava as férias lá e depois morou lá. E eu estava lá no momento da mudança, quando construíram uma cidade chamada Nova Rodelas e mudaram todo mundo pra lá. Foi uma experiência antropológica extraordinária. Todas as relações culturais e sociais com o lugar se perderam com a água. Teve muita gente que morreu deprimida, alcoólatra."

Para Wagner, o mergulho no passado inundado vale como exercício de memória, como tentativa de estabelecer uma conexão ainda maior entre seu pai e seus filhos. Mas não há disposição para reviver fisicamente tais lembranças ou promover o reencontro com o sertão que, com a devida licença poética, virou mar. "Tem muito mais de dez anos que eu não volto à cidade, talvez porque pra mim o melhor seja ficar com a lembrança. Muitos amigos da minha geração vazaram para outros lugares. E, mesmo que a cidade não tivesse sido inundada, a vida lá seria outra hoje. O artista que eu me tornei tem muito a ver com aquela infância que eu tive. Legal a oportunidade que Ronaldo me deu de bulir com isso."

O ano de 2007 foi o "ano Wagner Moura", com o ator surfando a maior e mais popular onda de sua vida até então ao lado de dois memoráveis personagens - o Capitão Nascimento e o vilão Olavo. Mas ele não vê dessa maneira. "Apesar de ter sido o ano em que me tornei um ator popular de fato, muito conhecido por causa de dois trabalhos muito populares que aconteceram meio que em paralelo, não consigo ver aquele ano dessa forma tão determinante", diz. "Eu ouvia muito essa pergunta na época: 'Este é o seu ano?' e tal. Tinha consciência disso, mas não conseguia mesmo enxergar dessa maneira. Como artista, o processo de fazer Hamlet em 2008, dizer aquelas palavras, juntar aquelas pessoas todas no teatro e fazer Shakespeare no Brasil, foi uma coisa que me impactou mais."

Agora, este resto de 2010, ano em que ele já lançou o primeiro e talvez único disco 100% independente de sua banda bissexta de brit brega, Sua Mãe (The Very Best of the Greatest Hits), tem tudo para repetir o feito. Desta vez com foco centrado apenas no cinema e em um único filme, a sequência mais esperada da cinematografia nacional. Comandante-Geral do Batalhão de Operações Policiais Especiais e depois Subsecretário de Inteligência, dez anos mais velho, o narrador Nascimento volta em Tropa de Elite 2 para preencher as lacunas que o primeiro filme deixou em branco: a quem o BOPE e as máquinas de intervenção e repressão servem verdadeiramente quando sobem nos morros e deixam corpos de bandidos no chão? O que é o verdadeiro crime organizado? Como se dá a relação imunda entre corrupção policial e política? Qual a verdadeira influência do Estado na configuração das políticas de segurança pública de uma cidade como o Rio de Janeiro? E, principalmente, o que acontece com um guerreiro urbano da mais brutal força da lei no país conforme ele vai envelhecendo e passando a entender sua verdadeira posição em um jogo que envolve, mais que boas intenções, interesses escusos? Enquanto esta edição é finalizada, o site oficial da produção indica na contagem regressiva que faltam sete dias, 22 horas e alguns minutos para o lançamento do filme. Mas Wagner entrega pouco: "Na secretaria de segurança, Nascimento começa
a entender de fato que talvez ele tenha dedicado a vida inteira a uma causa diferente da qual ele achava que defendia. O cara acha que está servindo ao povo, mas está servindo ao Estado, que são coisas bem diferentes, porque, historicamente no Brasil, o Estado, de um modo geral, serve aos interesses escrotos de quem está ali [no poder]." E completa: "Nascimento é o clássico personagem da tragédia grega, ele caminha inexoravelmente para um final trágico".

Você lê esta matéria na íntegra na edição 49, outubro/2010 na Revista Rolling Stone

Ai Ai Ai ele é mesmo O Cara né, e muito DELÍCIA

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